História 21
O mega espetáculo
(Continuação de As ideias são azuis)
O Café da Manhã é um grande espetáculo que engloba vários eventos, uns muito concorridos, outros quase desconhecidos. O Pó no Coador, por exemplo, é uma tarefa pouquíssimo conhecida, pois acontece quase sempre antes do público entrar no estádio. Somente uns poucos expectadores que conseguem chegar a tempo podem assistir, e sempre aplaudem as três batidas da Conchinha de Medida no Pote de Café, avisando que vai lançar o pó no coador.
Complementando o Pó no Coador vem o Derrame da Água, que consiste na chaleira despejando água fervendo no coador. É outro espetáculo interessante, igualmente assistido só pelos primeiros que chegam. Inicia com a demorada dobragem do Pano de Prato, para dar segurança à pegada da chaleira quente. Em seguida, a dupla derrama a água fervendo no coador, com uma técnica apuradíssima, sem respingar uma gota sequer, o que vale um elogio do locutor através dos alto-falantes do estádio: “Foi perfeito! Dez com louvor! Parabéééééns! (alongando o parabéns.)”
Essas são tarefas ainda desconhecidas do grande público, mas que sempre empolgam as poucas pessoas que conseguem chegar ao estádio a tempo de assistir. Por isso mesmo a Diretoria está avaliando a possibilidade de colocá-las entre os eventos cobertos pela mídia e transmitidos ao vivo pelas TVs.
O primeiro evento realizado com a casa cheia é o mais antigo e famoso de todos: o Torneio de Tirinhas. Esse espetáculo vinha perdendo público, até que foi instituída a modalidade Sub-20, com o limite máximo de 20 tirinhas, decisão que acertou em cheio o gosto popular e fez o torneio reviver os áureos tempos de sucesso, com casa lotada.
A vinda do facãozinho Serra Azul contribuiu para isso. Após as mortes trágicas e seguidas do facão Rebite Dourado e da faquinha Azul, o pequeno facão viu-se sozinho com seu mestre e protetor Rebite Prata, na missão de tocar em frente o torneio. Serra Azul demonstrou, desde o princípio, nítida dificuldade em lidar com queijos, pois sua lâmina curta muitas vezes era menor que a lateral do queijo, e ele inevitavelmante vacilava no corte. Todos esperavam que com o tempo ele adquirisse a habilidade necessária, pois no corte das tirinhas era um verdadeiro craque. Mas tal não aconteceu. Apesar de atualmente ser considerado um profissional experiente, Serra Azul só conseguiu se firmar por ser um excelente cortador de tirinhas, mas no manejo do queijo até hoje vacila.
O público, entretanto, o aceitou assim mesmo, e suas apresentações são sempre muito aplaudidas. Por vezes ovacionadas, tal a habilidade em lidar com detalhes, ao recompor as migalhas de pão e pedacinhos de queijo que se soltam. Em resumo, o Torneio de Tirinhas atravessa uma fase próspera, de grande sucesso.
O segundo evento importante, que acontece em seguida, é o Amassamento de Bananas, que empolga mais a cada dia. Os garfos e as colheres já têm seus parceiros preferidos; os garfos são muito aplaudidos pelo verdadeiro balé que executam ao amassar, e as colheres pela habilidade em formar camadas uniformes de farinha de aveia e, depois, de granola. Todos se divertem com o mau-humor do Pote de Farinha, que vive criticando a colher pelo esbanjamento de sua farinha, e como protesto, ranzinza, não se fecha direito. Mas o aplaudem nas raras vezes em que ele aprova o desempenho da colher, e fecha-se normalmente.
O terceiro evento, que em tempos idos não era sequer considerado, agora atrai grande público, tendo sempre a casa lotada: é a Pegada de Tirinhas.
Depois que sai do forno, a bandeja com as tirinhas é colocada na pia pela Toalha de Plantão, uma toalhinha que se dobra estrategicamente até formar uma faixa comprida. Ela já se tornou conhecida do público, por sua habilidade e simpatia. O público aplaude quando ela coloca a bandeja quente na pia previamente molhada, fazendo um chiado que todos se calam para ouvir.
Entra então em cena o Grande Pegador, recebido amavelmente pelo prato onde serão postas as tirinhas. É notória a amizade que se formou entre os dois, pois o Pegador chega sorrindo ao prato, para ser levado por ele até bem perto das tirinhas dispostas na bandeja.
O Pegador inicia então sua tarefa, cada dia com mais perfeição. Apesar de ser de metal, grande e abrutalhado, é capaz de pegar com extrema delicadeza cada tirinha da bandeja e transportá-la até o prato. O que mais empolga o público é a sua habilidade em pegar os fragmentos de pão e queijo que se soltam de uma ou outra tirinha, e colocá-los novamente no lugar. A ajuda do prato nesses momentos é notória, aproximando-se bastante para facilitar a ação do Pegador. Sempre explodem aplausos do público, e com razão, pois é quase incompreensível como um objeto com aparência tão abrutalhada atua com tanta delicadeza.
No final, através dos alto-falantes do estádio, novamente entra o locutor: “Perfeito! Absolutamente perfeito em todos os movimentos! Dez com louvor!” – E para encerrar, alonga-se no “Parabéééééééns!!!!”
Os últimos eventos do Café da Manhã acontecem nas Arenas do Consumo, onde as notas do Amassamento de Bananas e do Torneio de Tirinhas são anunciadas no grande telão do estádio. O Café da Manhã é realmente um majestoso espetáculo, em constante transformação, sempre projetando novos ídolos do público.
Mande sua opinião, ela será muito bem-vinda.
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