O PROFETA GENTILEZA
Há muitos anos, no Centro do Rio de Janeiro, um homem andava pelas ruas carregando nas mãos, à semelhança do profeta Moisés, tábuas cheias de inscrições. Exibia essas tábuas insistentemente aos transeuntes e aos passageiros que subiam e desciam dos ônibus, lendo em voz alta as inscrições. Esse homem vivera uma grande tragédia, ao perder sua família no incêndio de um circo, em Niterói. Todos o consideravam um desequilibrado mental.
Era de se esperar, portanto, que fosse esquecido em pouco tempo, porém acabou se tornando tão conhecido na época, que até hoje muita gente se lembra dele. Inicialmente o chamavam de “Gentileza” mas depois foi batizado de “Profeta Gentileza”. A sua fama se alastrou rapidamente por toda a cidade e até mesmo por outras distantes, através dos turistas vindos de vários estados do país. Após a sua morte, em maio de 1996, painéis contendo suas inscrições, muitas delas confusas e sem nexo, foram afixados em vários locais da cidade.
O que teria provocado tamanho alarde?
A resposta está contida numa frase, talvez a única coerente e constante em todos os seus sermões. Ele a repetia, diariamente, para milhares de pessoas: “Gentileza gera gentileza”.
Não é um dogma religioso, nem um princípio moralista, tampouco um jargão político. Somente uma frase, curta e simples, com três palavras apenas. Mas se atentarmos bem, veremos que esta frase contêm uma profunda verdade. Significa, no fundo, que fazer o bem atrai o bem como resposta.
Por essa razão, tais palavras atingiram o coração de todos. Ainda que ninguém se desse conta, quem as ouvia uma vez, jamais esquecia. Em pouco tempo, nos quatro cantos da cidade, pessoas que viram ou ouviram falar do Gentileza, comentavam sobre ele, umas com as outras. Sua frase “Gentileza gera gentileza” virou expressão popular.
Tal fenômeno não aconteceu por acaso.
O mundo é formado por sociedades extremamente competitivas, onde os homens, mulheres e até mesmo as crianças tornam-se cada vez mais agressivos e maldosos, cheios de pensamentos e emoções de rancor, inveja, desconfiança e medo, que acabam gerando novos pensamentos de igual teor.
Nem mesmo as religiões, que pregam o amor, a caridade e a paz, conseguiram libertar seus fieis nem a si próprias da forma competitiva de viver, pois cada uma se considera a verdadeira dona da verdade, e todas competem entre si. Esse sentimento é transmitido aos fiéis, que em vez de desenvolverem o amor ao próximo e à humanidade, como orientam suas escrituras sagradas, cultivam ainda mais a ganância e a prepotência. O resultado dessa generalizada educação competitiva é a violência nas sociedades.
Para combater a violência e promover a paz, muitos acham que basta divulgar a palavra “paz”, de todas as formas possíveis, mas isso de nada adianta. É muito difícil encontrar-se uma mensagem realmente pacifista. O lema do movimento Hippie, “Faça amor, não faça guerra”, remete mais ao sexo do que à paz fraterna. E o conhecido jargão “Violência gera violência”, fala em violência, não em paz.
A paz é um estado recíproco de fraternidade, consequência da troca permanente de gentilezas entre todos. Logo, quando alguém, com três palavras, conseguiu comunicar uma real mensagem de paz, era mesmo de se esperar que essa frase ficasse famosa.
Gentileza gera gentileza é a síntese de uma verdade óbvia, reconhecida por todos como sendo positiva e benéfica às mentes. Quando se faz uma gentileza, junto com ela vai uma afetuosa vibração mental, assimilada de forma consciente ou não, mas que gera uma resposta igualmente afetiva. A gentileza carrega consigo a solidariedade. É uma espécie de tratado de paz entre as pessoas. É uma discreta e elegante declaração de amor.
Por isso esta homenagem ao nosso “Profeta Gentileza”, que faleceu aos 79 anos, em 28 de maio de 1996. Ele prestou um real serviço à humanidade, pois suas palavras, de tão verdadeiras, foram capazes de ultrapassar a densa barreira da competição humana e alojar-se em inúmeros corações. Muita gente compreendeu, não com o intelecto, mas com o coração, o significado dessa frase; e se tornou mais mais fraterna com seus semelhantes.
É muito bom para a saúde mental repetir sempre que possível: “Gentileza gera gentileza”.
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